09/08/10 – 00:00 > BANCOS
Bancos falam em alterar estrutura de captação

Ernani Fagundes
SÃO PAULO – O presidente da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), Fábio Barbosa, afirmou na última sexta-feira que os instrumentos de captação disponíveis atualmente inviabilizam a concessão de crédito de longo prazo pelos bancos privados. “No contexto atual, os depósitos são de prazo muito curto. Então, não é factível que o setor privado assuma responsabilidade por operações de longo prazo”, argumentou.

O executivo acredita que o potencial de crescimento dos investimentos no Brasil é grande. “O que existe são perspectivas de crescimento estabilizado. A taxa de investimento pode sair de 18% do PIB e ir até 22% do PIB nos próximos anos. Uma coisa puxa a outra: uma taxa de poupança maior gera uma taxa de investimento maior”, argumenta o presidente do Santander.

“A infraestrutura vai demandar mais recursos do que o consumo até agora. O setor financeiro deve ocupar o espaço que se espera dele nos investimentos em infraestrutura”, ressaltou.

Questionado pelo DCI se o BNDES concorre com os bancos privados, Barbosa informou que o setor privado está olhando para a frente. “Estamos estudando como vamos fazer os financiamentos de longo prazo. Hoje o sistema financeiro não tem condições de fazê-lo”, explicou Barbosa.

Barbosa apontou o caminho para essa solução. “Precisamos de um arcabouço jurídico e de mercado que permita que o sistema financeiro possa atuar sem assumir riscos desnecessários.”

Barbosa destacou que a solução para que a taxa de investimento possa crescer está no mercado de capitais. “A própria criação das Letras Financeiras vai nessa direção”, exemplificou.

Segundo o presidente da Febraban, o investidor quer ter a perspectiva de fazer depósitos de longo prazo, mas também, caso ele precise de dinheiro, poder fazer a venda do título através de negociação no mercado secundário. “Não é que uma pessoa quer fazer um investimento por 20 anos, na verdade ela quer ter certeza de encontrar quem compre um papel por um prazo mais longo no mercado secundário, onde ele possa obter a liquidez necessária”, detalhou Barbosa.

O presidente do BNDES Luciano Coutinho justificou com números a forte presença do banco no crédito a empresas. “Os investimentos fomentados através da Bolsa de Valores caíram de 15,6% de participação em 2008 para 3,7% em 2009” apontou.

Coutinho detalhou o perfil dos investimentos produtivos. Os realizados a partir de lucros retidos haviam recuado de 45,3% para 43,6% no ano da crise.

E as empresas tiveram de se endividar mais para investir, as captações externas cresceram de 6,1% para 8,9%, e a emissão de debêntures avançou de 3,1% para 4,2% no período avaliado. Diante desse cenário, justificou Coutinho, a presença do BNDES no crédito para investimento teve de subir de 30% para 39,6% de participação.

De acordo com dados fornecidos por Coutinho, a taxa de investimento está caminhando para 19% este ano. Ele projetou a taxa de investimento para os próximos anos. Será de 19,4% em 2011, 20% em 2012, 21,4% em 2013 e 22,2% projetada para 2014.

Ainda nos dados divulgados por Luciano Coutinho, ele demonstrou que o setor industrial precisa de R$ 550 bilhões anuais em investimentos produtivos.

Coutinho afastou as críticas sobre a forte presença do banco na economia. “Essa não é uma política do BNDES, é uma política do governo implementada para dar rapidez ao investimento produtivo”, diz.

“Ela funcionou muito bem, inicialmente com uma taxa de 4,5% ao ano e depois a taxa subiu, e esse benefício tem até o final do ano como data-limite”, registrou Coutinho, sobre o prazo para fim do incentivo.

“Se o BNDES apoiasse empresas altamente fragilizadas ou legalmente impedidas, por razões cadastrais, de operar com o câmbio, o BNDES estaria fazendo papel de hospital.”

“Mas o BNDES não fez esse papel. O que o BNDES fez foi apoiar aqueles que tinham condições para minimizar os problemas do setor”, justificou Coutinho.

O presidente do banco se defendeu das críticas de políticos e economistas. “Eu acho que esse tipo de crítica é desinformada, por várias razões”, respondeu.

“A metade do apoio do BNDES é pesadamente em infraestrutura. Na indústria há uma ampla gama de setores apoiados”, justificou Coutinho.

Ele explicou quais são os critérios para obter financiamento na instituição. “Toda empresa que chega ao BNDES, que tem um bom projeto, consistente com taxa de retorno e garantias, é apoiada”, detalhou o presidente do BNDES.

“Não existe predeterminação, favoritismo. Tudo depende da consistência dos projetos”, respondeu ele, aos jornalistas que questionavam o direcionamento dos recursos do banco de investimentos federal.

Durante a palestra, o presidente do BNDES falou da importância do desenvolvimento do mercado de capitais.

“A eventual diminuição do tamanho do BNDES deve vir acompanhada do desenvolvimento do mercado de capitais e de crédito para auxiliar o financiamento do investimento. Há um custo fiscal nesse processo de transição”, argumentou.

Ele apontou o caminho para esse processo. “Temos de buscar mecanismos indutores num processo de migração para alongar o perfil da poupança.”

Neste ano, o banco de fomento bateu recordes de desembolsos para empresas, e é muito criticado pelos empréstimos feitos pelo Tesouro Nacional para capitalizar o banco e permitir a ampliação da carteira de crédito. A revista The Economist chegou a chamar a instituição de pouco transparente na semana passada.

A principal homenageada do prêmio organizado pela revista Banco Hoje, a presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), Maria Helena Santana, informou de que o órgão regulador quer dar mais transparência aos produtos do mercado de capitais. “Estamos em processo de finalização para melhorar as informações de recompra desses produtos, como os FIDC [Fundos de Investimento em Direitos Creditórios]”, disse a presidente.

Questionada se a autarquia vai analisar a adoção de covered bonds para financiar o mercado imobiliário, Santana informou que ainda não há qualquer estudo sobre o tema.

“Os nossos produtos de securitização, como o CRI [Certificado de Recebíveis Imobiliários] são bastante simples e estão se desenvolvendo. Produtos mais sofisticados exigem maior regulamentação e controle, como vem sendo sugerido pelo G-20 [grupo das vinte maiores economias do mundo]”, respondeu Santana.

O presidente da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca), Antônio Castro, ressaltou o talento da CVM em liderar o processo de regulamentação. “A CVM iniciou um processo de simplificação a partir da Instrução 480, que possibilita o desenvolvimento do mercado de capitais”, elogiou Castro.