Por ASA FITCH e LIAM PLEVEN

O preço do petróleo nas alturas está inundando os países árabes de dinheiro. Mas, enquanto antes o grosso dessa riqueza seria injetado nos mercados financeiros mundiais, agora boa parte dela está sendo gasta em casa.

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Bloomberg News

Um novo arranha-céu sendo construído no distrito financeiro do rei Abdullah em Riad, capital da Arábia Saudita.

 

Os Estados do Golfo estão embarcando em sua maior onda de gastos da história, derramando dinheiro em projetos domésticos — desde novos imóveis e hospitais até a restauração de mesquitas e a criação de empregos. Em boa parte, é uma reação defensiva aos levantes da chamada Primavera Árabe, que derrubaram outros governos do Oriente Médio no ano passado. Os gastos governamentais na região devem alcançar US$ 488,6 bilhões este ano, segundo estimativas recentes do Instituto de Finanças Internacionais, um aumento de 35% em relação a 2009.

O foco nos gastos internos ainda não corroeu os investimentos externos — espera-se que os ativos externos líquidos da região do Golfo aumentem em cerca de US$ 300 bilhões só neste ano. Mas esse foco doméstico significa que menos petrodólares estão sendo canalizados para os mercados financeiros mundiais. Novos padrões de gastos também estão inchando os orçamentos governamentais, e direcionando para projetos sociais muitas verbas que antes seriam destinadas a fins como aumentar a produção petrolífera ou comprar novos equipamentos militares.

“Quando a Primavera Árabe aconteceu, muitos governos descobriram que o inimigo estava dentro e não fora”, disse Mustafa Alani, consultor sênior do Centro de Pesquisas sobre o Golfo, sediado em Genebra, e especialista em questões de segurança regional.

Ao todo, os governos do Golfo — incluindo a Arábia Saudita, os Emirados Árabes Unidos e o Kuwait — se comprometeram, na esteira das revoltas da Primavera Árabe, a gastar mais US$ 157 bilhões, segundo relatório do Bank of America Merrill Lynch do ano passado. Isso equivale a cerca de 13,4% do PIB da região em 2011. Para evitar qualquer possível instabilidade, as monarquias do Golfo esbanjaram dinheiro em projetos simpáticos à população, tais como salários mais altos, bônus para os funcionários públicos e casas novas.

Isso foi possível graças a um aumento de 93% no preço médio do petróleo da Opec nos últimos três anos. Desde 2009, a receita líquida de exportação petrolífera dos membros da Organização dos Países Exportadores de Petróleo quase dobrou em termos nominais, para US$ 1,03 trilhão no ano passado, e a Administração de Informações de Energia dos EUA prevê que o número cresça novamente para US$ 1,17 trilhão em 2012, caindo ligeiramente em 2013.

O salto nos gastos domésticos é uma aceleração de uma tendência já visível há dez anos no sentido de reconstruir a infraestrutura da região. Ao todo, estima-se que os países do Golfo tenham US$ 1,8 trilhões em investimentos de capital previstos ou em curso para os próximos 15 anos. “A Primavera Árabe acelerou tudo isso, com todos os países aumentando seus gastos”, disse Rachel Ziemba, economista da Roubini Global Economics.

A mudança é especialmente notável na Arábia Saudita, maior produtor mundial de petróleo e o país mais populoso da região. Na tentativa de evitar qualquer ameaça à ordem política e social, o rei da Arábia Saudita Abdullah anunciou em março cerca de US$ 70,9 bilhões em gastos com habitação e saúde no país, além de fixar um salário mínimo e dar bônus aos funcionários públicos.

É verdade que os produtores de petróleo do Golfo continuam a investir nos mercados internacionais, mas tem havido uma mudança notável nos ativos que eles procuram.

Os Estados Unidos foram um dos três principais destinos estrangeiros para os fundos soberanos da Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e Kuwait de 2006 a 2009, segundo a firma de dados Dealogic. Mas o país caiu para o sétimo lugar em 2010 e 2011, enquanto a Espanha e a Austrália, grande fornecedora de matérias-primas para a China, se tornaram os principais focos de interesse nesses anos. O Brasil, um mercado em rápido desenvolvimento, foi o principal destino até agora em 2012, segundo a Dealogic.

“Há mais investimentos indo para os mercados emergentes, especialmente na Ásia, mas a América Latina também é um novo foco”, disse Ziemba.

Uma imobiliária que pertence ao governo de Abu Dhabi investiu no início do ano US$ 2 bilhões no grupo carioca EBX, do empresário Eike Batista. Mas os banqueiros que lidam com o rico emirado dizem que ele ultimamente está levando mais tempo para concretizar negócios.