É indiscutível que já era hora de o Brasil ter taxas de juros mais civilizadas. Entre outras benesses, a queda da Selic para um dígito vai favorecer investimentos em infraestrutura, permitir que o setor privado tenha maior acesso a crédito, incentivar os investimentos em bolsa de valores, desenvolver o mercado imobiliário e permitir ao país um maior planejamento de longo prazo.

No entanto, para os poupadores que se acostumaram a obter retornos atraentes com risco baixo em aplicações de renda fixa, a vida ficou bem mais difícil. Hoje, com a Selic em 8,75% ao ano, o rendimento dos títulos públicos pode ser considerado pífio se comparado ao de dez anos atrás. No início de 1999, em seus primeiros dias à frente do Banco Central, o ex-presidente da instituição Arminio Fraga chegou a jogar os juros para 45% ao ano como forma atravessar a crise de confiança enfrentada pelo Brasil logo após a desvalorização do real.

A primeira consequência da redução da Selic deve ser o aumento do apetite por risco. Quem é conservador e se acostumou a ganhar muito dinheiro com aplicações em títulos públicos, provavelmente terá de apostar agora em fundos mais arrojados de renda fixa ou multimercados. Abaixo o Portal EXAME explica algumas alternativas de risco baixo que ainda podem garantir um rendimento de até 1% ao mês. Pode parecer pouco, mas não é. Títulos públicos ou caderneta de poupança pagam ao investidor um retorno inferior a 0,70%. Às alternativas:

1- Fundos multimercados “low vol”: como qualquer multimercado, esses fundos podem aplicar o dinheiro do cotista em diversas classes de ativos. No entanto, os fundos “low vol” prometem ao investidor, muitas vezes em contrato, uma pequena volatilidade ao longo do mês, de no máximo 3%, por exemplo. Isso significa que o ganho ou a perda mensal dessa aplicação não pode ultrapassar esse percentual. Os fundos “low vol” oferecem baixo risco ao investidor porque a maior parte dos recursos fica investida em títulos públicos. Só uma pequena parcela é direcionada a papéis de renda variável, entre eles ações e contratos de opções. Mesmo que o gestor faça uma aposta errada em uma dessas operações, como o resto do patrimônio do fundo estará aplicada em papéis bem mais seguros, a perda será muito pequena. Por outro lado, se uma pequena operação no mercado de opções for bem-sucedida, a valorização do contrato pode ultrapassar 500%.
“Esse produto foi desenvolvido para o investidor que quer risco baixo. Pode ser uma pessoa física acostumada a ganhar com títulos públicos, mas que agora quer dar uma pequena turbinada na aplicação. Também pode ser um fundo de pensão que já direciona boa parte de seus recursos em renda variável e quer deixar o resto em algo levemente mais arriscado que a renda fixa”, diz Jacob Weintraub, sócio-gestor da Oren Investimentos. Segundo ele, recentemente o fundo “low vol” da Oren tem conseguido entregar aos cotistas um retorno próximo a 140% do CDI, equivalente a 1% ao mês.

2 – Debêntures: são títulos de dívida privada bastante usados por empresas que querem fazer investimentos. Funcionam da mesma forma que os títulos públicos emitidos pelo governo. O Tesouro Direto, inclusive, é considerado por especialistas uma boa forma de as pessoas físicas darem seus primeiros passos no mercado de renda fixa. O movimento seguinte seria investir em debêntures, que pagam um juro maior que o dos papéis do governo. Em uma emissão em julho, por exemplo, a TAM emitiu debêntures com vencimento em 2013 que pagam um rendimento de 126,5% do CDI. Não é o suficiente neste momento para atingir um retorno de 1% ao mês, mas isso deve acontecer com a provável alta dos juros no próximo ano. Os contratos de juros futuros com vencimento em janeiro de 2011 negociados na BM&F já superam 10% ao ano. Para os analistas do banco britânico Barclays, o Banco Central deve começar a elevar a Selic (taxa básica de juros da economia brasileira) a partir de julho e projetam um juro de 10,75% em dezembro do próximo ano.

As debêntures, no entanto, também têm desvantagens. “Antes de comprar esses papéis, é necessário analisar o balanço da empresa, verificar se ela tem uma capacidade de geração de caixa suficiente para honrar suas dívidas”, diz Manuel Lamas, responsável pela área de renda fixa da XP Investimentos. Isso pode ser feito de duas maneiras: 1) Analisar o balanço da empresa; ou 2) Pedir aconselhamento a um profissional.

As debêntures também possuem um mercado secundário com muito pouca liquidez. Em geral, o investidor terá de carregar o papel até seu vencimento e não poderá utilizar o dinheiro investido para outros fins nesse período. Os títulos públicos, ao contrário, podem ser revendidos ao governo todas as quartas-feiras, quando Tesouro Nacional faz leilões de recompra. Uma terceira desvantagem das debêntures é que muitas emissões exigem um investimento mínimo inviável para pessoas físicas. “Mas isso tende a mudar”, diz Lamas. “As empresas já perceberam que há um apetite de pequenos investidores por esses papéis e vão querer aproveitá-lo.” A Vivo, por exemplo, fará uma emissão de 600 milhões de reais em debêntures em outubro. Cada papel terá um valor de mil reais – bastante acessível, portanto, a pessoas físicas.
3 – Outros títulos de crédito: As debêntures não são a única classe de investimento em títulos privados no Brasil. Os FIDC (fundos de investimentos em direitos creditórios) começam a se tornar bastante comuns e possuem uma grande vantagem em relação às debêntures: risco pulverizado. Se uma empresa quebrar, quem comprou suas debêntures pode não receber nada de volta. Já os FIDC incluem pacotes de empréstimos vendidos ao mercado por instituições financeiras. Esses pacotes incluem crédito pessoal, financiamento a veículos, duplicatas comerciais e outros tipos de empréstimos. Se uma pessoa não pagar uma prestação de financiamento do seu veículo, o prejuízo para toda a carteira será pequeno. Além disso, em geral os FIDC têm duas cotas: uma sênior, que é onde entra o investidor, e a outra subordinada, que é do banco. A cota subordinada arca primeiro com as perdas da inadimplência e, só depois de ultrapassado um certo patamar, os investidores da cota sênior passam a ter prejuízo também.

Em troca desse risco menor que o das debêntures, os FIDC costumam pagar uma remuneração um pouco mais baixa. O banco Modal, por exemplo, possui um FIDC que rende 110% do CDI. Para render 1% ao mês, um fundo teria de comprar créditos bastante arriscados. Em geral, a análise do risco de um FIDC é feita por uma agência de classificação de risco. O prêmio que será pago aos investidores será maior ou menor dependendo da nota que a agência conceder aos papéis. Além dos FIDC, outra opção de crédito privado são os CRI (certificados de recebíveis imobiliários). Lastreado por um empreendimento imobiliário, o CRI tem uma grande vantagem sobre o FIDC: o ganho do investidor pessoa física está isento de Imposto de Renda.

A popularização desses instrumentos de crédito ainda depende de avanços regulatórios e de uma maior sofisticação do mercado. Para Marcelo Xandó, diretor da gestora de recursos Verax, j´ahá cinco anos o crédito privado pode ser considerado uma categoria viável de investimento no Brasil. “Da mesma forma que os investidores costumam diversificar suas carteiras com títulos públicos, fundos multimercados e ações, acho que é saudável ter também uma parcela dos recursos investida em crédito”, diz Xandó. “Mas isso tem de ser feitos aos poucos, para que o investidor tenha tempo de aprender o funcionamento de cada instrumento de crédito.”

Fonte: Portal Exame por João Sandrini