25/11/2011 às 00h00 – Por Vicky Bloch – Valor
Acabo de voltar de um curso em Harvard sobre empresas familiares. Dentre tantos assuntos pertinentes que foram discutidos ao longo de uma semana, um ‘paper’ apresentado pelo professor John Davis me chamou a atenção. Escrito por ele em conjunto com o professor Renato Tagiuri, o artigo mostra que a qualidade do relacionamento entre pais e filhos na empresa depende dos respectivos momentos de vida.
É de conhecimento público que os problemas entre os familiares que trabalham juntos afetam não apenas os indivíduos e suas vidas particulares como também a performance da organização e, muitas vezes, a economia em torno dela. O interessante, no entanto, foi essa constatação de que as oscilações na qualidade dos relacionamentos são naturais e inevitáveis.
O estudo, que avaliou o ciclo de vida dos homens, define os estágios que são considerados mais difíceis: entre 17 e 22 anos, entre 34 e 40, entre 41 e 50 e entre 61 e 70. As melhores fases, mais harmoniosas, são aquelas quando o homem tem entre 23 e 33 anos e entre 51 e 60. Isso significa que se o pai está na casa dos 40 anos e o filho tem 20, provavelmente eles terão uma relação problemática no trabalho. Ambos vivendo uma fase de questionamento da sua identidade, com forte carga emocional predominante, a parceria tende a ser tensa e conflitante, já que um pode distorcer as mensagens enviadas pelo outro e enxergar as necessidades do outro como ameaças. Neste ponto da carreira, o filho quer sentir que tem muitas oportunidades de carreira e não se sente na obrigação de fazer o relacionamento com seu pai ser bem-sucedido no trabalho.
Um pai com mais de 60 e um filho de 40 também não vivem seu melhor momento na empresa. O mais novo, experiente e com um histórico de muitos anos de trabalho na organização, sente-se mais capaz do que o próprio pai, em fase de aposentadoria, e quer mostrar sua autoridade. Já o patriarca, por sua vez, especialmente se for o fundador, quer manter as coisas do seu jeito e não aceita, muitas vezes, as mudanças de grande impacto que querem ser promovidas pelo filho. Trata-se também do momento de colocar em prática o processo de sucessão, que por si só já é desgastante e complexo. Se não for muito bem amarrado, pode ser desastroso e comprometer o futuro da companhia.
Já um filho de 28 com um pai de 55 formam uma combinação extremamente harmoniosa e produtiva. Nessa fase, ambos já são mais maduros e vivem um bom momento de carreira, com forte capacidade física e intelectual para contribuir para o negócio.
As similaridades e diferenças entre pai e filho no trabalho também parecem estar relacionadas ao momento de vida de cada um, como o nível de energia, habilidades, interesses, expectativas e necessidades, características que afetam diretamente o cálculo que cada um pode fazer sobre os custos e benefícios de trabalharem juntos. Todos esses dados indicam que os objetivos da organização, de certa forma, estão ligados aos estágios de vida dos indivíduos.
O estudo confirma também a tese de que os filhos não devem trabalhar com seus pais durante a fase de formação da própria identidade. Quando o filho sai da escola ou da faculdade e começa a trabalhar com o pai, é como se houvesse uma extensão do controle paterno sobre a sua vida em uma fase em que ele está querendo se desvencilhar da infância e dos conflitos familiares. A separação durante um período é fundamental tanto para que os jovens criem essa identidade fora da família como para que a presença dos filhos por perto não atrapalhe os próprios conflitos internos e questionamentos dos pais.
E qual a lição disso tudo? A de que, sabendo e aceitando que essas diferenças ocorrerão inevitavelmente ao longo dos anos, pais e filhos podem se antecipar e se preparar para isso, beneficiando assim a organização e até mesmo os relacionamentos. Quanto mais ambos souberem que suas necessidades irão mudar ao longo do tempo, assim como as expectativas em relação ao outro, menor a chance de ficarem jogando a culpa um no outro em razão de suas incompatibilidades. Ao cultivarem a habilidade de se olharem objetivamente, com empatia, eles ajudam a melhorar essa parceria de natureza tão sensível.
Vicky Bloch é professora da FGV, do MBA de recursos humanos da FIA e fundadora da Vicky Bloch Associados